ALEMÃO DO CIRCO
- No Circo Irmãs Baciocchi grandes holofotes cruzavam o picadeiro de ponta a ponta. Todos ficavam na maior expectativa para ver o leão Sarazani. Eu não, tava mais interessado no palhaço. “Vamos trazer para vocês agora a dupla do riso: Batista e Finca-Finca”. E o povo aplaudia. Era bonito! Choravam de dar risada, adultos, velhos, garotos.
- Eu saia do espetáculo e já ia com meus amigos brincar de circo. Você já reparou que em brincadeira de criança sempre tem um líder? Comigo era assim. Eu cobrava até ingresso: um palito de fósforo para cada.
- Vivia varando circo pra conseguir entrar de graça. Na minha aventura, sempre lembro que comecei varando circo. Mas, de todos os varadores, fui o único que se interessou de ser artista. Logo eu já estava com o Tareco no Circo-Theatro Nh’ana, aprendendo tudo com eles.
- Acho que foi em 1969 que eu montei o meu próprio circo. Primeiro na pracinha da Vila Menezes. Circo-Theatro do Alemão. Nascia o Alemão do Circo!
- Minha paixão mesmo era o drama, nunca tive essa vontade de ser palhaço, daqueles que pintam a cara. Eu fui por precisão, porque o circo era meu. Eu vivia o papel. Se fosse pra chorar, eu chorava mesmo!
- Na época eu ia muito no Largo do Paissandu pra resolver assuntos do meu circo. Ali ficava o Café dos Artistas. Contratei muita gente boa lá pra tocar. Eles vinham de São Paulo e enfrentavam cada estrada pra fazer show no circo!
- No circo, eu gostava de fazer tudo ao meu modo, coisas nossas. Muitas vezes mal acabava de escrever a peça, já punha em prática. Escrevi as primeiras antes mesmo de ter circo, porque gostava.
- A Marisa do Circo, minha esposa, me ajudava a ter mais controle da renda e minhas filhas ficavam quietinhas assistindo aos ensaios. A família virou circense: até meu pai gostava de acompanhar a gente, fez bilheteria e sempre ajudava a levar os materiais.
- O Nenê era meu cromo de palhaço nas comédias, fazia números como ventríloquo e foi o melhor ponto que eu tive nos dramas. Nós fizemos muita gente dar risada por aí. “Com vocês, Alemão e Bizuca!”. E a turma aplaudia!
- O que mais fiz com meu circo foi bairro, zona rural. Não fui muito longe, nem em tantas cidades, mas em cada rebimboca da cidade, eu tive lá! Fazenda Velha, Campininha, Turninos, Campo de Experiência…
- Nós malhávamos o Judas em qualquer lugar. Me diziam “olha, lá não vai dar público”. A gente ia e dava. Uma época em que em qualquer porta de venda se tirava um dinheirinho. A gente dava espetáculo no chão de terra.
- Era cada vez mais dificultoso com as nossas três crianças ainda pequenas. Teve um dia que estávamos quase subindo no palco e a minha mulher teve que dar banho. Sempre enguiçava, começamos a atrasar o horário do espetáculo. Tava difícil pra todo mundo e começou uma certa má vontade da turma, o que deixava tudo nas minhas costas.
- Enquanto isso, eu ficava tentando pôr em ordem: não gostava de nada fora do lugar. Aí chegou um dia que subi no palco e anunciei: hoje vai ser a última apresentação do circo.
- Depois de um tempo, como gostava tanto da coisa, resolvi que ia voltar para a estrada com um circo reduzido: era de pau fincado e depois fiz de pau estaqueado.
- Na época do circo reduzido só dava pra fazer espetáculos que tivessem um elenco reduzido também. O que acontecia mais com as comédias. A vida era dura e a turma queria mais é dar risada. Era sucesso certo!
- O tempo passou, começou a ficar ruim de viajar. Resolvi que seria por um tempo o último espetáculo. Dei baixa temporária no circo e voltei pra marcenaria. Era o fim do Circo-Theatro do Alemão.
- Hoje o Alemão tá de volta: foi homenageado lá no Largo Paissandu, primeira vez que levei os apetrechos pra capital, no Centro de Memória do Circo, com uma exposição e mostra. Viva o Circo-Theatro do Alemão!