O Artista

por Felipe Abramovictz

Nascido em 1939 em Tietê e radicado em Tatuí, no interior de São Paulo, Expedycto Lyma realizou mais de vinte longas-metragens, dez deles em super-8 (entre 1979 e 1984), o que o torna o mais profícuo realizador do país na bitola em longas-metragens de ficção. Com extensa trajetória no circo-teatro, foi dono de companhia, ator, dramaturgo, atuou como palhaço (quando recebeu as alcunhas de Alemão e Polaco) e, além disso, exerceu a profissão de marceneiro para garantir o sustento.

Tais diferentes ofícios, porém, não se dissociam em nenhum momento do seu fazer artístico e são parte do seu modo de pensar o cinema, questão essa que tem como ponto chave o “pavilhão” por ele construído para, de forma circulante, exibir seus filmes em bairros distantes do centro urbano. Essas sessões eram por vezes precedidas de números cômicos nos quais o próprio Expedycto entrava em cena.

Com um projetor no porta-malas, Lyma levou suas produções para os pontos mais distantes da zona rural do estado de São Paulo, onde exibia seus bangue-bangues “sertanejos, mas meio djanguescos”, comédias, dramas, histórias de aventuras, policiais, enredos com pitadas de terror, assim como alguns filmes nos quais o erotismo se fez bastante presente.

Produtor incansável, poeta, roteirista, diretor, ator, diretor de arte, técnico de efeitos especiais, trilheiro, divulgador, bilheteiro e sobretudo um artesão da cena, voltou a filmar em VHS no fim dos anos 1990, quando teve que buscar novas maneiras de viabilizar sua produção. Sempre com auxílio de amigos, entusiastas do seu cinema e antigos parceiros de cena dos tempos do circo, sua obra se destaca pelo forte apreço pela cultura regional caipira deglutida em um caldo cultural no qual a cultura cinematográfica e os códigos do cinema de gênero dão o tom.

Expedycto, um caipira renascentista [por Luna Alkalay]No balaio de Expedycto Lyma - circo, cinema e sonhos [por Verônica Tamaoki]Quando o desejo do cinema se materializa nas bordas - Sobre os filmes de Expedycto Lyma [por Bernadette Lyra]O cinema é sonho? [por Sheila Schvarzman]

por Expedycto Lyma

Meus amigos, minhas amigas, respeitável público!

Quem vos cumprimenta sou eu, Expedycto Lyma, o popular Polaco, ator, produtor, diretor e cineasta.

Minha carreira artística começou no Circo-Theatro. Viajei com o circo dos outros, tive meu próprio circo e mais tarde arranjei elenco para fazer shows e teatro pelas redondezas. Meu pseudônimo no circo era o palhaço Alemão, mas quando sai do circo resolvi mudar para o humorista Polaco.

Em 1979, quando conheci Neusa Silveira que se tornou uma grande amiga, contei pra ela do meu sonho de produzir um filme. Segui sempre trocando ideias com amigos sobre filmes, artistas, até que um dia, o amigo Luiz Silvestre sugeriu que tentasse fazer eu mesmo. Aí discutimos o assunto e o Ademar Machado, que já gostava de filmar em Super-8, sugeriu fazer 10 minutos de filme para experimentar. Achei que não era justo só 10 minutos, botei tanta fé na coisa, e quis fazer uma história completa. Como diz o caso: “Não dá pra ficar nesse faz não faz… Já que vai fazer, fazer valer…“.

O pior é, que na época, era muito caro e não tínhamos cacife para isso.

Cada um foi pra sua casa, com a vontade de chegar nesse ponto que era quase impossível. Fiquei naquilo sempre pensando no pouco dinheiro, mas trabalhando. O tempo foi passando e eu sempre otimista na coisa, juntando recursos financeiros.

Com coragem, fundei a Explym Produções, que foi provisoriamente batizada como EL Produções. Uma experiência que acabou dando certo. A companhia cinematográfica era formada pelos seguintes componentes: Expedycto Lyma, Neusa Silveira e Luiz Silvestre Vaz de Campos, tendo como primeiro cinegrafista Ademar Machado, que também foi o editor do primeiro filme em Super-8 dirigido, escrito, produzido e interpretado por mim, Expedycto Lyma.

Esse filme foi A Víbora Humana. Filmamos nos fins de 1979 para 80 e nessa fita eu faço dois papéis: o fazendeiro e o irmão dele, Venâncio, o vilão. A Neusa Silveira interpreta a Dona Marta, a vilã da história. Ademar Machado foi o cinegrafista. O Luís Silvestre atuou e também foi o responsável pelos letreiros do filme.

Em 1980, Ademar Machado teve que nos deixar por motivos financeiros. Continuamos com Paulo Rex como cinegrafista e juntos produzimos Na Trilha do Ódio, no qual eu faço o destemido Capitão Gregório, ao lado da mesma Neusa Silveira que é a Giseli. Desta vez, o vilão e rival é interpretado pelo Alceu Antunes.

A partir daí não paramos mais. Ao lado de Maria Madalena, Rosecler Camargo e André Peres como o vilão, produzimos Dois Nós Cegos no Oeste, um bangue-bangue na base da sátira, no qual faço o personagem Chola e André faz o parceiro Fredô. Em seguida, fizemos um filme misterioso, terror com um pouco de humor com a minha querida Cely Soares, o vilão e galã, André Peres e eu, que interpreto o personagem malvado, O Misterioso Sr. Moretti.

Depois fizemos um filme tipo range. É quase um bangue-bangue cuja maior parte foi rodada em Iguape, litoral Paulista. No famoso filme, Estigma da Violência, como destaques temos André Peres, Alceu Antunes, Celi Soares Rozecler Camargo. Eu interpreto um delegado federal, o Juared Aguiar e meu auxiliar é o Astézio que faz o Zé.

Aí demos um tempo e foi quando Paulo Rex, nosso cinegrafista, deu a ideia de produzirmos um filme sobre o famigerado bandido Dioguinho. Fiz o roteiro e saiu esse lindo bangue-bangue genuíno, O Filho de Dioguinho. No filme vários amigos, como o Zelão do Circo, colaboraram. O Zelão interpreta o personagem coronel Tibúrcio e eu o personagem Dioguinho ao lado de Gheysa Oliveira que interpreta Marina. Como o público gostou desse estilo na época, decidimos fazer a continuação, Dioguinho Volta para Matar, com os mesmos personagens

Vocês vejam que loucura! Empolgado, eu percebi que o cinema brasileiro estava produzindo muitos filmes de pornochanchada e pornográficos. Então eu pensei: porque nós não produzimos também?  Aí decidimos produzir três filmes proibidos para menores de 18 anos, e saiu o primeiro, O Gosto Amargo da Vingança, que vem a ser a continuação de Estigma da Violência. Nesse filme não podia faltar o André Peres interpretando o vilão e eu o justiceiro ao lado da linda Gina Marta.

Não paramos mais e saiu o filme O Despertar de Um Pesadelo, no qual interpreto um personagem bagunceiro que cai numa enrascada ao descobrir um mercado de escravos. Gheysa Oliveira ao meu lado, e os vilões da história Alceu Antunes, Rogério Oliveira e Antônio Perdigão.

Depois produzimos um filme romântico ao lado de Otília Oliveira, Eliane Lyma, Roberta Araújo, Rogério Oliveira, Gheysa Oliveira. O título é: Um Inesquecível Amor, onde interpreto o personagem Marcelo.

Encerramos a carreira do Super-8 em 1984, depois de nosso décimo filme.

Adeus Super-8 que nos deu tanta alegria! Conquistei muitos amigos e amigas que me deram muita força e coragem para seguir em frente nessa linda carreira que é a Sétima Arte. O cinema é maravilhoso!

Por problemas financeiros Explym Produções foi obrigada a parar por doze anos. Com a era do vídeo, foram desativando todos os laboratórios de revelação dos filmes S-8. Era o vídeo que mandava! No começo, não pudemos continuar porque as aparelhagens eram muito caras.

Mas sempre com muito otimismo fomos em frente e produzimos os primeiros filmes em vídeo. Como não tínhamos muita prática no começo e com elenco novo, não foi fácil. Além de ensiná-los, tínhamos outro problema: não sabíamos como lidar com a nova aparelhagem.

Em 1996, na Explym começamos o primeiro filme em vídeo, com um novo elenco, e alguns dos antigos atores. Rex, o segundo cinegrafista também nos deixou por motivos profissionais, pois ele era funcionário da CESP e foi transferido para Cesário Lange. Assim sendo, tivemos que operar a câmera nós mesmos. Tivemos um terceiro cinegrafista de quem preferimos não citar o nome, pois não deu prova. Então treinamos rápido um de nossos colaboradores, Luiz Cargolyver, também ator, que junto com Expedycto Lyma, filmava nas horas em que não atuava. E na união houve entendimento e fomos adiante produzindo mais de 10 filmes, incluindo os espetáculos de teatro ao vivo, além de 15 cortinas cômicas.

Com muito sufoco rodamos as primeiras cenas de Noivado Sangrento. Devido a gente se perder no roteiro escrito, o filme ficou muito comprido e decidimos dividi-lo em dois: o primeiro como Sertão em Conflito e o segundo como Noivado Sangrento.

No elenco, Marisa Monteiro, Yolanda Sonsym, Nenê Avalone, Zé Guri e Jane Lima que faz a Tia Neusa da história. Eu faço o Floriano, um forasteiro, capataz de fazenda contratado, pelo coroné Ramiro. “Valter Anacreto”, e quem faz o vilão, é o Hernandes J Coelho. Quem filmou foi Luiz Cargolyver, que virou cinegrafista, por precisão.

É uma bonita história que vale a pena ver!

Não paramos por aí e produzimos um filme diferente com cenas de arrepiar. Estamos falando de: A Ronda da Morte. O filme mostra a tenebrosa história de um psicopata que foge de um sanatório e age cruelmente numa cidade do interior. O perigoso Douglas, interpretado por mim, aterroriza Bacaetava e Várzea, matando irmãs gêmeas e quem estivesse no seu caminho.

Dois agentes da polícia, Sargento Manfredi, interpretado por Luiz Cargolyver, e Quirino, vivido por João Correia Sousa investigam o caso, mas as chances de sucesso são mínimas. A tia do perigoso bandido, vivida por Yolanda Sancym facilita, mandando um carro para ele usar nas suas barbaridades cruéis.

De uma comédia que nós apresentávamos em circo ou em teatros por aí, O Jeca na Cidade, aproveitei a oportunidade para fazer um filme em homenagem ao grande ator brasileiro Mazzaropi. Produzimos então O Sonho do Jeca, interpretado por mim, tendo ao meu lado Jane Lima que interpreta a comadre Bixiga, Yolanda Soncym que interpreta Justina, a esposa do Jeca, o forasteiro interpretado pelo Hélio e Valter Anacreto interpretou o Padre. E nós cantamos no filme, relembrando os tempos de Mazzaropi.

Engraçado, há muito tempo atrás, eu nem pensava em ser artista, era moleque lia livrinho de história em versos travados. Em um desses livrinhos que se vendem em feira, mercado, etc. achei interessante uma história, e aí tive a ideia de forjar o roteiro, e então, modificando e aumentado um pouco, produzimos essa obra magnífica, A Sogra Maldita, estrelando a Yolanda Soncym, no papel principal. No filme eu interpreto um índio macumbeiro.

Muito comentado naquele tempo foi o filme do Rambo e suas continuações. Escrevi, então, uma comédia para teatro: Ramboscofe, que apresentamos em vários lugares, antes de filmar em vídeo. A gente gostava mesmo era de levar os espetáculos ao povo. O pessoal gostou e daí com mais personagens na história e pondo mais molho e pimenta, fizemos Um Rambo Esculachado. O filme foi produzido delicadamente, com uma história dramática e bastante humor. Eu, Expedycto Lyma, interpreto esse personagem na base da sátira.

Sabe quem é o vilão da história? O Gilmar Edson Rolim, que interpreta o perverso capitão Kaio. Seu Perdinari, vivido por mim, tem duas netas, Karina e Raquel, vividas por Jane Lyma e Yolanda Soncym. O Zé Guri interpreta o secretário do Rambo Esculachado. Vale a pena assistir ao filme inteiro até!

Daí então, demos um tempo, pra descansar um pouco. Foi quando Cargolyver me convidou pra fazer um filme cômico com todo elenco falando um sotaque bem caipira. Eu disse tá bom, vamos fazer só que eu quero tudo sertanejo e se errarmos no sotaque, voltamos atrás até corrigir. E a gente foi atrás de um amigo, ator, humorista, o Vicente Poeta. O convidamos para ser o João Coronha do filme e ele topou. Felizmente saiu a comédia Vai Fogo, Pimentão!

Em 2001 produzimos Sentimento Mortal, que conta a história de dois amigos inseparáveis, justiceiros, que ao encerrar sua carreira de bangue-bangue se separaram. Severiano Raiale, forma-se delegado de Santa Teresa e Diego Severo vai pra Santa Cecília e se torna proprietário de um haras, um fazendeiro muito poderoso, que manda em Santa Teresa. Depois de doze anos os dois se encontram novamente por motivos pessoais. Fábio, o filho de Diego Severo e seu amigo Gino, vêm à Santa Teresa, e por simples divertimento, estupram e matam a esposa de Severiano Raiale, o delegado. Samanta, a filha de Severiano, também é atacada por Gino, mas consegue fugir, e corre contar ao pai. Severiano quer levar Fabio Severo pra ser julgado, mas Diego Severo e seus capangas tentam impedir que a prisão seja efetuada pois naquele lugar, assassinato desse tipo, a lei é pena de morte. Laura, a amante de Diego, ajuda Severiano trazendo uma Winchester, mas o capataz vê e conta ao patrão da traição.

Aí está o resumo do filme. Muita ação, expectativa e a coragem de um homem sozinho, que age com um sentimento mortal. No elenco deste filme maravilhoso, temos como destaques: Eu, Expedycto Lyma, sou Severiano Rayale, Luiz Cargolyver é Diego Severo, o dono do haras, Yolanda Soncym é Sheila, uma índia Guarani, esposa de Severiano e Odete Junqueira, é Laura, amante de Diego.

Amigos e amigas inseparáveis,
Essa é a carreira do artista
A coragem e dedicação do ator.
Minha vida é um palco iluminado
Nos shows patrocinados levo minha arte
Um adeus ao S-8 mm. Viva o VHS
Adeus ao VHS. Viva o DVD
Viva o cartão, adeus o cartão, viva a memória.

Entrevista com Expedycto Lyma, por Felipe Abramovictz - Revista Movimento (ECA-USP)

O projeto “Cinema é Sonho” propõe um percurso pela trajetória do cineasta e artista circense Expedycto Lyma, nascido em Tietê e radicado em Tatuí, no interior de São Paulo. Dedica-se a publicação de um livro (em versão impressa e e-book) escrito pelo pesquisador Felipe Abramovictz, a uma série de eventos em torno de sua obra (como leituras dramáticas, exibições, lives, debates com pesquisadores e parceiros) e a uma exposição concebida a partir dos objetos do seu acervo. Contempla ainda uma catalogação completa e um trabalho de recuperação e digitalização do seu arquivo em película, em vídeo, e de seus manuscritos, que incluem poesias, letras de música e especialmente, suas peças teatrais, materiais que estarão integrados ao livro.

Trata-se de um raro documento da obra de um criador popular brasileiro que, a partir de recursos próprios e inquebrantável tenacidade, soube percorrer o estado de São Paulo com seu circo-teatro (entre o fim da década de 1960 e os anos 1970) e com seu cinema ambulante (após 1979).

“Cinema é Sonho” foi concebido tendo como base de pesquisa as entrevistas realizadas pelo pesquisador Felipe Abramovictz, com Expedycto Lyma e seus colaboradores, entre os quais, atores de seus filmes e integrantes de sua companhia de circo-teatro como Luiz Cargolyver (Luiz Carlos Oliveira Júnior), Jane Lima, Eliane Lima, Maria Aparecida Oliveira, Paulo Rex, Neusa Silveira, José Gury, Claudiney Velasco, Ademar Machado, Luiz Silvestre, Otília Oliveira, Ivan Gonçalves, Márcio Gomes da Silva e Luiz Carlos Baldassin (Caio) e Pedro Henrique de Campos.

A pesquisa no acervo pessoal do artista, para além dos filmes, resultou em mais de 5500 arquivos, entre páginas de manuscritos de peças teatrais, canções, poesias, roteiros, fotografias e cartazes. Somente de sua dramaturgia, foi possível localizar inúmeros roteiros e 33 textos teatrais completos escritos originalmente para serem encenados no Circo-Teatro do Alemão ao longo da década de 1970, alguns deles nunca levados ao palco, os quais foram pela primeira vez transcritos, publicados e também disponibilizados por meio de leituras dramáticas. Além disso, integram o projeto filmagens feitas pelo amigo e pesquisador Felipe Abramovictz com o artista em sua casa, nos locais onde Expedycto montou seu cinema ambulante e seu circo-teatro, assim como em alguns cenários de seus filmes (material que já totaliza mais de 70 horas). Para o livro, Felipe parte dos relatos orais de Expedycto, que são reescritos em forma de relato em primeira pessoa, entremeados com referências de suas obras (ilustrações de próprio punho, cartazes, fotos), de forma a propor uma reflexão sobre origens, importância artística e impacto cultural dessa manifestação cultural.

Pretendemos permitir que a obra de Expedycto Lyma receba, final e merecidamente, uma divulgação mais ampla e possa ser publicada em livro e estudada por meio de eventos sobre sua trajetória artística. Tomando como ponto de partida o espaço do convívio e as potencialidades do encontro quase diário entre o artista Expedycto Lyma e o autor/pesquisador Felipe Abramovictz que resultou em um amplo material de pesquisa, o livro “Cinema é Sonho” permitirá destacar as aproximações e cruzamentos com distintos aspectos da cultura popular presentes na sua obra, sobretudo uma forte referência da cultura caipira. Trata-se de um importante resgate da dramaturgia do circo-teatro, sobre a qual as publicações são escassas, e do dito Cinema de Bordas. Desta maneira acreditamos recuperar, em grande medida, essa decisiva expressão da Cultura Popular brasileira que durante décadas foi presença constante de nosso imaginário artístico.

O projeto apresentado faz parte do projeto de pesquisa desenvolvido junto ao programa de Multimeios da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) como parte da tese de doutorado do pesquisador Felipe Abramovictz, o qual pretende investigar como a produção na bitola Super-8 caracteriza-se como um fenômeno cultural de resistência da maior importância ao longo da Abertura Política (1974-1985), momento no qual a produção atingiu seu ápice em termos de difusão e teve seu gradual decréscimo. Tais câmeras, lançadas em 1965, chegam ao Brasil no contexto de 1968, momento marcado por grandes mobilizações populares nas ruas – fortemente reprimidas – e muita efervescência (seja ela política ou artística) seguida, em dezembro, do início da vigência do AI-5, e que atingem seu ápice de popularização no fim da década de 1970, o que traz à tona um novo horizonte de produção de imagens. Cabe destacar, por exemplo, a facilidade técnica com a qual poderiam ser manipuladas, já com fotômetro integrado, zoom elétrico, um sistema de revelação por meio de cartuchos, que poderiam ser facilmente substituídos e com um preço acessível para setores da classe média-alta. O Super-8, portanto, enquanto uma bitola essencialmente amadora e que inicialmente não possuía um circuito de distribuição e exibição estabelecido, passa a mostrar-se uma alternativa viável para realizadores de distintas trajetórias.

É nesta bitola – um meio certamente menos regulado pela censura no qual, na maioria das vezes, os filmes circulavam em cópias únicas levadas pelos realizadores a cada exibição – que emergem novas formas de produção audiovisual à margem dos meios de produção e distribuição tradicionais, o que permite com que realizadores como Expedycto Lyma pudessem filmar. Este caráter supostamente despretensioso do superoitismo, que se aproxima do fazer não profissional e, por excelência, mais livre, frequentemente incluía uma falta de compromisso com uma viabilidade econômica da produção que reverbera em um conjunto de obras, que flertam com o amador.

Neste sentido, mesmo situando sua produção diante de aproximações com outros realizadores do mesmo período, a obra de Lyma é totalmente singular e de grande relevância: realizou dez longas em Super-8 – fato que o torna o mais profícuo realizador do país na bitola em longas de ficção. Seu cinema se caracteriza por uma deglutição de referências da cultura pop, entremeadas por distintas relações com a cultura regional caipira, assim como as múltiplas relações que envolvem também seu ofício anterior em sua companhia de circo-teatro que se fazem ecoar em toda a sua filmografia.

Seja nos “pavilhões cinematográficos” por ele construídos para, de forma circulante, exibir seus filmes em bairros distantes do núcleo urbano da cidade (sessões estas por vezes precedidas de números cômicos nos quais o próprio Expedycto entrava em cena) ou mesmo na maneira como ele, levando o projetor no porta-malas, exibia nos rincões da zona rural seus bangue-bangues, comédias, dramas, histórias de aventuras, policiais – assim como alguns nos quais o erotismo se fez bastante presente –, Expedycto se destaca sobretudo como um artista popular do interior paulista que, apesar de pouco conhecido para além das redondezas, fascinou seu público durante décadas.

Trazer os lúcidos depoimentos plenos de detalhes, referências e memórias de Expedycto Lyma, octogenário, abre a possibilidade de recuperar para pesquisadores, interessados e público em geral, a força e a imensa importância de uma arte praticamente anulada de um artista de grande destaque regional, mas pouco conhecido para além das cidades nas quais se apresentou. A iniciativa de dar visibilidade a suas obras, anteriormente inacessíveis, pretende ser o ponto de partida de um trabalho de resgate de sua trajetória da dramaturgia do circo-teatro de um autor profundamente ligado a suas raízes cujo acervo estava se deteriorando e agora foi catalogado, digitalizado e disponibilizado ao público.

Ocupação artística em torno da obra de Expedycto Lyma, que contempla uma exposição realizada no espaço da vitrine do circo do Centro de Memória do Circo com exibição de objetos do seu acervo pessoal e o Festival Cinema É Sonho, com leituras dramáticas, exibições de filmes e bate-papos.

Local: Centro de Memória do Circo (Galeria Olido – Largo do Paissandu) – 20/04/2022-02/11/2022

"Mostra Cinema É Sonho - o superoitismo sertanejo de Expedycto Lyma", na Cinemateca Brasileira, que incluiu 11 sessões dos longas de Expedycto Lyma, exposição do acervo do artista no foyer da Sala Grande Otelo com cenografia de Jaime Pinheiro, intervenção musical dos cururueiros da cidade de Tatuí, bate-papos com o homenageado, com as convidadas Veronica Tamaoki, Sheila Schvarzman - além de Luna Alkalay e Felipe Abramovictz. Na ocasião, houve o evento de lançamento do livro "Cinema É Sonho", de Felipe Abramovictz, com distribuição de exemplares

Local: Cinemateca Brasileira (Largo Sen. Raul Cardoso, 207) – 23/02/2023-26/02/2023 (Mostra) e 23/02/2023-26/03/2023 (Exposição)

"Mostra Cinema É Sonho ", na Alesp incluiu uma exposição do acervo do artista, bate-papo com os organizadores, evento de lançamento do livro "Cinema É Sonho" e duas leituras dramáticas com convidados

Local: Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo – 27/03/2023-14/04/2023

"Mostra Cinema É Sonho ", no Museu Histórico Paulo Setúbal em Tatuí incluiu distintas ações entre os meses de abril e setembro de 2023, caso de uma exposição do acervo do artista, bate-papo com o curador, evento de lançamento do livro "Cinema É Sonho", projeções de filmes, videomapping na fachada do museu e intervenção musical com os cururueiros da cidade de Tatuí

Local: Museu Histórico Paulo Setúbal – distintas ações entre os meses de abril e setembro de 2023

Coordenador, autor e pesquisador

Felipe Abramovictz

Felipe Abramovictz é doutorando em Multimeios (Unicamp), mestre em Comunicação Audiovisual (PPGCOM-UAM) e graduado em Comunicação e Multimeios (PUC-SP). Além disso, cursa especialização em patrimônio audiovisual pela DiPRA (Diplomatura en Preservación y Restauración Audiovisual, Buenos Aires), e tem formação em “Direção de Fotografia para Cinema e TV Digital” (sob a coordenação de José Augusto de Blasiis) e em teatro pelo Conservatório de Tatuí (2010-2013).
É autor do livro “Cinema É Sonho” (2023), e co-roteirista e diretor de fotografia do longa “Trópico de Leão”, dirigido por Luna Alkalay (2023, em finalização). Atua como artista do vídeo, diretor de fotografia e pesquisador de cinema brasileiro.
Atualmente dedica-se à recuperação do acervo do superoitista paulista Expedito Lima, realizador de dez longas na bitola entre o fim dos anos 1970 e o início dos anos 1980, e a um livro sobre o cineasta intitulado “Cinema É Sonho”, viabilizado através de recursos do PROAC. A partir da pesquisa, organizou mostras e exposições na Cinemateca Brasileira, na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, no Centro de Memória do Circo e no Museu Histórico Paulo Setúbal.
Desenvolve ainda projeto a partir dos acervos pessoais do cineasta e roteirista Juan A. Siringo (“Cinema à Deriva”) e de Otoniel Santos Pereira, que ao longo dos anos de 2020-2022 permitiram a recuperação de parte de seus materiais fílmicos. A partir da pesquisa, organizou a Mostra Otoniel Santos Pereira - Cinema de Pele e Osso”, na Cinemateca Brasileira.
Realizador dos documentários “As Imagens de Aury” e “Valsa de Julho”, longas-metragens em que atuou como diretor e montador. Em parceria com Lívia Gijón, realizou “Curta Pipoca”, documentário desenvolvido através de uma série de encontros com três pipoqueiros, Conde, Júlio e João em seus pontos de trabalho que propõe um percurso entre suas memórias e histórias para refletir a relação afetiva entre a pipoca, a cidade e a experiência do cinema. É co-diretor (ao lado de Luna Alkalay) do longa-metragem Eu Gatto, griô Tropical (2023), sobre a história do artista da dança, produtor e ativista Eufrásio Gattto Félix, um dos fundadores do grupo Novos Baianos.
Na sua atuação profissional, destaca-se os estágios docentes feitos nas Pós-Graduação da Universidade Anhembi Morumbi e da graduação em multimeios (Unicamp). Foi responsável pelo desenvolvimento das videoaulas do projeto “Formas de aprendizagem dos alunos e estratégias de ensino: hipóteses, cruzamentos, possibilidades e experimentações” (PIPAD PUC-SP), a produção e edição do curso “A luz de Hannah Arendt em Tempos Sombrios no Brasil”, realizada pela Escola de Governo. Além disso, participou da curadoria da mostra Brasil do festival Kinoforum 2018 através do programa “Visionamento em Curso” e da curadoria do projeto “Programação em Curso” ação Festival Kinoforum 2016 realizada junto à PUC-SP.
No coletivo A Ponte participa de processos multidisciplinares para explorar as fronteiras entre a dança e o vídeo, inclusive colaborando com a direção e edição de “O dia que dancei para ela”. Também desenvolve pesquisa “Cinema de Rua”, um projeto fotográfico e de intervenção urbana em cinemas abandonados ou que mudaram de função social, e faz parte da elaboração do projeto “Jornada do Patrimônio Perdizes”, mapeando os bens tombados do bairro.
Organizou as Mostras “André Luiz Oliveira - Cinema de Dentro”, retrospectiva completa da obra do cineasta com exibição de mais de trinta títulos, entre curtas e longas, assim como bate-papos e intervenções musicais, realizada em setembro de 2023, e “O Cinema à Deriva de Juan Siringo”, anunciada para novembro de 2023, ambas na Cinemateca Brasileira.
Designer Gráfica

Victoria Lobo

Designer gráfica formada pelo Centro Universitário Belas Artes de São Paulo (FEBASP), e já realizou projetos no ramo editorial e digital. Criadora da revista “Estéticas da Internet", fruto de seu projeto de conclusão de curso, a qual busca analisar as diferentes manifestações gráficas surgidas na pós-internet. Atualmente é designer no portal Modefica, mídia independente com foco em ambientalismo interseccional e ilustradora freelancer.
Editora e revisora

Luna Alkalay

Trabalha com linguagem audiovisual desde 1970. É diretora da empresa MaDaM Editora. Dirigiu e roteirizou o curta-metragem “Sangria” (1972). Foi responsável pelo roteiro e co-direção dos curtas “Arrasta a Bandeira Colorida” (1970) e “Lacrimosa” (1970). Roteiro, produção e direção do longa-metragem “Cristais de Sangue” (1975). Roteiro e Direção do longa-metragem “Estados Unidos Do Brasil”. Prêmio Estímulo da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo com o argumento do longa-metragem “Por Trás das Câmeras”, Pesquisa e Texto do CD “Nossa Senhora Aparecida Iluminada”, narração de Lima Duarte e músicas de Renato Teixeira, Roteiro e Direção do documentário “Para Amigos” sobre os Jogos Para Pan-americanos, Roteiro e Direção do Institucional “Cultura Guarulhos”, Produção e Roteiro da animação “GELÊ” veiculada na “TV Rá Tim Bum”. Pesquisa, Roteiro e Realização de série de 12 vídeos sobre Sustentabilidade intitulada “Boas Idéias, Boas Experiências” para a Fundação Herbert Daniel, Prêmio Desenvolvimento de Roteiro com o Argumento “Planeta Luz” no concurso de Telefilmes da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo, Coordenação Geral do “Projeto Mensagem de Fernando Pessoa” (03 CDs, 02 DVDs), Co-roteirista do longa-metragem “Louco por Cinema”, Co-autoria do Projeto de Filme de Longa Metragem “Vozes do Silêncio”. Texto e Edição do livro “Sheila Mann A Culinária Do Líbano A Israel”, Edição do livro “Vi como Cego Vê”, de poemas de Eliete Barros. Atualmente trabalha na adaptação do Roteiro “Alma Que Tirou Corpo Fora” para série de 05 episódios para o Canal Brasil, no roteiro do filme de longa metragem “Paixão de Fã” e no projeto da série “Amazônia Secreta”.
Assessoria de Imprensa

Adriana Bueno

Produtor

Deco Gedeon

Produtor. Estudou música (piano performance) e ciências humanas e se formou em Economia (major) e Administração de Empresas (minor) pela The University of Texas at Austin. Desde 2001 atua como produtor de eventos corporativos, agente cultural, produtor de diversos formatos da expressão criativa, agente e empresário de artistas renomados. Coordena turnês nacionais e internacionais, carreiras, projetos incentivados e projetos especiais. Coordena redes sociais para empresas e artistas. Alguns dos artistas que Deco Gedeon trabalha ou já trabalhou: Manager/empresário da cantora Zizi Possi – de 2009 a 2015; Manager/empresário da cantora Zélia Duncan – de 2011 a 2017; Manager/empresário do cantor Zeca Baleiro – de 2012 a 2017; Agente do cantor SILVA – 2016 a 2019; Manager/empresário da cantora SIMONE – de 2013 a atual; Manager/agente da atriz e cantora Alessandra Maestrini – 2017 a atual; Produtor executivo da peça teatral “Totatiando” de Zélia Duncan – 2011 a 2016; CD “Tudo Se Transformou” de Zizi Possi – 2013; CD e DVD “Chão de Giz, Zeca Baleiro canta Zé Ramalho” – 2015; Produtor executivo do musical “A paixão Segundo Nelson” – 2016; DVD de animações “A viagem da Família Zoró” de Zeca Baleiro – 2016; Produtor executivo da série televisiva “Baile do Baleiro” – 2016; Diretor de produção do espetáculo “Yentl em Concerto” – 2017 – atual; DVD e CD – “Silva Canta Marisa Ao Vivo” – Produtor associado – 2017; Diretor de produção “Fanfarras na Paulista” – 2017; Diretor de produção do musical “O Som e a Sílaba” – 2018 – atual; Turnê nacional e internacional Simone encontra Ivan Lins – 2018, 2019; Diretor de produção – “Futuro na Cultura – Apaa 2018”; Turnê nacional do disco “Brasileiro” do cantor Silva – 2018, 2019.
Desenvolvedor Web

Angelo Silva

Formado em Design Digital e especializado em Gestão Estratégica de Negócios pela FIAP, Angelo possui mais de 10 anos de experiência nas áreas de Criação, UX e Desenvolvimento Web. Por entender o fluxo de desenvolvimento de projetos digitais do planejamento ao deploy, virou um apaixonado por ajudar outros negócios a solucionarem suas dores com design e tecnologia, tendo a oportunidade de trabalhar para empresas como P&G, Banco Original, Unilever e Fundação José Luiz Egydio Setúbal. Acredita que o design com propósito precisa estar alinhado com processos consistentes de coleta e análise de dados.